13/07/2009

Algumas reflexões melancólicas sobre os últimos desenvolvimentos da política à portuguesa


Desde que escrevi o último post sobre o ponto final na Convergência para Lisboa que algumas coisas se têm vindo a modificar na política portuguesa e, um pouco em jeito impressivo, gostaria de partilhar convosco algumas das minhas preocupações.

Realizou-se na semana passada um almoço que juntou antigos apoiantes de Sá Fernandes e que deram conhecimento à cidade que tinham criado uma associação, Lisboa é muita gente, para concorrer à Câmara da capital. Sá Fernandes chegou mesmo a apelar a uma convergência de esquerda, dizendo que iria reunir-se com António Costa para ultimarem a realização de um acordo. Domingo esse acordo é assinado num dos miradouros mais bonitos da cidade, o da Graça.
Andou um conjunto de lisboetas a recolher assinaturas para um apelo a uma convergência de esquerda e eis que tudo acaba com Sá Fernandes a apossar-se desse desejo e a convergir com Costa. Desde que o Bloco lhe retirou a confiança já pressentíamos que era isso que iria acontecer, só não sabíamos como. Ficámos a saber.
Quando o apelo à Convergência de Esquerda foi lançado, Jorge Sampaio tornou público o seu apoio, apesar de não o assinar. Falou-se igualmente em José Saramago, mas este encontrava-se hospitalizado e ninguém poderia jurar que da sua boca ou da sua pena tinha saído qualquer recomendação nesse sentido. Houve uma notícia num jornal e foi a partir daí que se começou a dizer que o mesmo era igualmente apadrinhado pelo Saramago. Parece que houve um desmentido do PCP a dizer que não era verdade.
Posteriormente, veio a público uma declaração de Saramago a afirmar a sua concordância com o apelo e hoje sabemos claramente que apoia António Costa. Carlos do Carmo, mais explícito, assinou o apelo à convergência, apareceu mesmo na sua sessão de enceramento. Hoje é o mandatário de António Costa.
Vim a saber que vai igualmente ser activado, a partir de alguns dos peticionários da convergência, um novo apelo denominado CLAC – Cidadãos Lisboetas Apoiam António Costa.
Fiquei com a sensação depois de tudo isto que o apelo já continha no seu bojo um claro encaminhamento para o apoio ao Costa. Sinto algum desconforto na figura que eu e outros andámos a fazer nisto tudo. Paciência, temos que aprender.

Fui dos mais entusiastas apoiantes das Sessões que se realizaram quer no Teatro da Trindade, quer na Aula Magna e juntaram o Bloco de Esquerda e Manuel Alegre. Na primeira, a Renovação Comunista participou como uma das suas promotoras, na segunda, apesar dos seus principais dirigentes estarem quase todos presentes, não juro que tivesse obtido o realce que teve na anterior.
Eu próprio fui escrevendo vários textos em que enaltecia o papel de Manuel Alegre e previa uma possível alteração na correlação de forças partidária, reforçada por esta junção de esforços entre a esquerda do PS e o Bloco, com a participação de independentes. Foi inclusive, na sequência da reunião do Trindade que me zanguei com o meu amigo Fernando Redondo, do DoteCome, tendo até abandonado a colaboração no seu blog. Podemos dizer que levei demasiado a sério as perspectivas de unidade que aqueles encontros poderiam proporcionar.
Em Março, depois de alguns episódios a que chamei a novela Manuel Alegre, faço um aviso à navegação para que não “acaba tudo com Manuel Alegre e Sócrates nos comícios eleitorais a darem vivas ao PS”. Parece que pelo menos esse perigo já foi ultrapassado. Com o seu recente artigo, É urgente acordar, Manuel Alegre consegue, até com alguma clareza, distanciar-se do PS oficial e do seu Secretário-geral. A crítica é certeira e tira o tapete àqueles que a pretexto de vem aí a direita se preparam para que se volte ao círculo vicioso ou nós, o PS de Sócrates, ou a Manuela Ferreira Leite, com a figura do Cavaco a agigantar-se por detrás. Esta alternativa com que o PS já nos começou a matraquear a cabeça, tem que ser quebrada e este artigo de Manuel Alegre, a exigir mudanças profundas no PS, não desmerece dos encontros que ao longo do ano se foram tendo com ele. Espero não deitar foguetes antes do tempo. No entanto, hoje António Vitorino, no comentário político que tem na RTP I, Notas Soltas, considerou tão inoportuno aquele artigo, que me deu alguma esperança da sua real utilidade.

4 comentários:

operáriom companheiro de Ulisses disse...

é tudo encenações medíocres de velhos actores viciados na traição e no engodo para levar os mais distraídos ao engano .... velhos cânticos das sereias ...quem não quer ser seduzido que se ate ao mastro da nave....

Bernardino Aranda disse...

Duas notas:

A Associação Lisboa é Muita Gente não pretende - segundo os seus fundadores - concorrer às autarquicas. É uma associação cívica que quer discutir lisboa e politicas para Lisboa.

Não percebo bem a tese do Apelo pela convergência de esquerda Vs Sá Fernandes... Dizes tu: "Andou um conjunto de lisboetas a recolher assinaturas para um apelo a uma convergência de esquerda e eis que tudo acaba com Sá Fernandes a apossar-se desse desejo e a convergir com Costa"

Como é que é? Quem assina o paelo pela convergência de esquerda não pode depois convergir a não ser que seja com todos ao mesmo tempo?

O homem tem vindo a desenvolver o seu trabalho na câmara na área do ambiente, do Plano Verde, etc. Está visivelmente satisfeito com o trabalho realizado e não é para menos (acrescento eu). O António Costa pede-lhe para fazer parte das listas dele. Ele vai ter com as pessoas que desde sempre têm acompanhado o seu trabalho, pessoas que desde sempre têm defendido a estrutura ecológica, que criaram esse conceito em Lisboa! Que defendem e estudam a mobilidade sustentável há décadas, que já andavam de bicicleta na cidade ainda eu - que agora também ando - dizia que era totalmente impossivel. Vai e pergunta qual é a base programática que deve exigir para aceitar participar nas listas. Desenham um acordo onde sobressaiem as questões ecológicas, do plano verde e das ciclovias. Chegam a acordo. Onde está o mal? A quem é que ele devia ter pedio autorização primeiro? Aos primeiros subscritores do Apelo?

Não percebo. Honestamente...

Anónimo disse...

Partilho as tuas reflexões em relação ao apelo, também sinto que todos os desenvolvimentos que se seguiram , novos apoios a António Costa, etc, acabaram por dar uma "facadinha" ao apelo inicial.
Margarida Moreira

Jorge Nascimento Fernandes disse...

Caro Bernardino
Vamos aos factos. Na primeira conferência de imprensa dos peticionários a Televisão Pública entrevista Sá Fernandes. Na conferência de imprensa final, quando se declarou que a convergência à esquerda era impossível, a única pessoa entrevistada pela Televisão Pública, que era a única que estava presente, foi o Sá Fernandes. Bem pôde o Rui Nery falar que se fartou para a televisão, que nem uma palavra apareceu. No almoço que reuniu apoiantes do Sá Fernandes, em que se lançou a tal associação para discutir Lisboa, a Televisão Pública inicia a notícia falando do apelo à esquerda do vereador e depois aparece o Sá Fernandes a dizer que integraria as listas do António Costa. Parecem-me demasiadas coincidências. Para mim, que ando nisto há muito tempo, começou a ser relativamente claro que o Sá Fernandes se iria servir do apelo para integrar as listas do Costa. Poderia ter dito: "eu sou na esquerda o único – pelos vistos já não é único – que cumpri o apelo de esquerda, coliguei-me com o PS".
Por outro lado, há muito que se suspeitava que o Sá Fernandes iria integrar as listas do Costa, só não se sabia de que modo é que o faria. Se aparecesse como simples independente não teria o peso que assim adquiriu. Formou uma associação com alguns vultos importantes, como o Ribeiro Telles, que de facto já o tinham apoiado noutras ocasiões, e em nome dessa associação apelou a um acordo com o Costa. Quanto a mim, para quem se dizia que não percebia nada de política, é brilhante.
Tudo o mais só o futuro o dirá. E eu, enquanto tiver possibilidades físicas, lá estarei na Assembleia Municipal para chumbar ou apoiar as medidas que ele for tomando relativas ao ambiente e aos espaços verdes.