10/02/2010

Governo, José Sócrates e PS


As declarações que hoje o primeiro-ministro fez sobre o caso das escutas, para lá de representarem um completo desatino em matéria de transmissão de mensagem – está convencido que quanto mais gritar e criminalizar os jornalistas mais as pessoas lhe dão razão – revelam, ao mesmo tempo, um jogo de sombras preocupante.
Assim, nas primeiras declarações que fez, já lá vão uns meses, não sabia nada de nada. Até o seu correligionário António Vitorino declarou, nas Notas Soltas, que eram erradas, porque já todos sabiam que a TVI estava à venda. Depois, mais tarde, quando se começou a falar no processo Face Oculta, já veio dizer que oficialmente não sabia de nada, o que é muito diferente. Hoje finalmente vem declarar que o Governo nunca deu ordem para que a PT comprasse a TVI. Ou seja, o discurso foi-se afinando, de modo a se chegar a este preciosismo de que o Governo não decidiu em Conselho de Ministros que a PT iria comprar a TVI para afastar José Eduardo Moniz e Manuela Moura Guedes.
É interessante que no telejornal da hora do almoço, da RTP, o locutor ao resumir o que disse Sócrates declara que ele nunca tinha dado ordem para se comprar a TVI. Enquanto Sócrates falava no Governo o locutor já estava a transpor a decisão para Sócrates, coisa que de facto ele não se atreveu a declarar.
Torna-se portanto claro que Sócrates vai-se cada vez mais refugiar na acção do Governo, para garantir de que nada de que o acusam é verdade, quando não é difícil perceber que a actuação de um primeiro-ministro e da sua entourage é uma coisa que nunca estará de certeza vertida para decreto-lei. Já outra, diferente, é a acção do Governo que, segundo penso, terá que ser decidida em Conselho de Ministros ou pelo menos em despacho ministerial.
Portanto, Sócrates ainda não desmentiu que, com a cumplicidade de uma série de homens de mão, que espalhou por empresas públicas e privadas e que só o conseguiu fazer porque é primeiro-ministro, estava a preparar-se para calar de vez vozes incómodas, para ele, que não para a direita, verdade se diga.
É aqui que entra o PS. José Sócrates não toma estas atitudes enquanto Secretário-geral daquele partido, mas sim enquanto primeiro-ministro que tem o poder para o fazer. O PS só serve, primeiro, para lhe fornecer quadros fieis e depois para justificar a posteriori estas suas acções. Vimos hoje uma série de militantes, provavelmente com a morte na alma, a justificarem o injustificável, na certeza porem de que se não o fizessem tudo isto revertia para o PSD e para a direita. E é sempre para não dar armas ao adversário que se justificam as piores vilanias cometidas pelos nossos. A gente séria e de mãos limpas, que ainda existe naquele partido, se não toma qualquer atitude, não só se afunda com Sócrates, como é corresponsáveis pelo que tem vindo a acontecer.

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