03/10/2011

A polícia, o chanfalho e a direita portuguesa

Durante 48 anos a direita portuguesa sempre recorreu ao chanfalho ou ao cassetete para pôr na ordem os trabalhadores portugueses. Salazar propunha que se desse uns “safanões a tempo” naqueles que protestavam para se evitar males maiores. A direita sempre foi caceteira e sempre recorreu à repressão para dirimir os conflitos e protestos sociais e políticos. Nós já nos esquecemos disso, mas é bom recordá-lo às novas gerações.

O célebre capitão Maltês, de pingalim na mão, a dar ordem aos seus polícias para arrearem nos estudantes, é uma imagem que nunca mais me há-de esquecer e que dá bem a ideia do que era a direita portuguesa no tempo do fascismo.

Hoje, cheia de boas maneiras e de sorriso nos lábios lembra-nos que se não formos a bem, e resistirmos às propostas da troika, recorrerá com sempre o fez aos mesmos métodos que a está habituada. Veja-se as declarações de Pedro Passos Coelho, ameaçando a esquerda se ela não se portasse bem (ver aqui – esta versão tem a resposta das centrais sindicais e dos principais líderes de esquerda).

Mas este episódio passou-se no Verão, quando se poderia dizer que o primeiro-ministro andava de cabeça esquentada pelo Sol da Manta Rota. As palavras foram esquecidas e a direita nunca mais  falou no assunto, apesar do tema vir sempre à baila, quando os jornalistas interrogam alguém da esquerda, sobre se este estava à espera de tumultos sociais devido a esta política.

Mas eis que hoje o tema se torna mais grave. Na primeira página do Diário de Notícias (ver aqui), logo ao alto, vinha a notícia PSP e Secretas à espera dos maiores tumultos desde os tempos do PREC e em baixo como se as duas coisas estivessem relacionadas 100 mil pessoas saíram à rua na primeira “manif” da era Passos Coelho. Já conhecíamos a vocação do Diário de Notícias para jornal provocador. Ainda nos lembramos do célebre e-mail que este jornal publicou na campanha eleitoral do Verão de 2009, violando a mais elementar ética profissional e que esteve na base da vitória de Sócrates. Agora, como o governo mudou, aí temos o Diário de Notícias a deixar sair uma notícia, obviamente encomendada, sobre um relatório secreto da Polícia sobre possibilidades de agitação social. À noite todas as televisões pegaram no assunto (ver, por exemplo, aqui e aqui), cada uma ao seu estilo, mas todas elas relacionando a manifestação do dia anterior como o primeiro ensaio da futura agitação social.

Estamos perante um acto grave de provocação da direita, com o auxílio da polícia (PSP) e de uns rapazes dos sindicatos da mesma, que a despropósito, resolveram também meter o bedelho onde não eram chamados. Espero que meditem se é assim que pensam contar com a solidariedade da população para as suas lutas sociais.

É evidente que nas muitas notícias que a TV propalou há uma mais benignas, afirmando que a PSP não tem medo das manifestações da CGTP, mas sim daquelas que estão previstas para o dia 15 de Outubro, que não têm um interlocutor bem definido, e que até, pecado dos pecados, se realizam simultaneamente com outras no estrangeiro, com o perigo agravado de alguns alienígenas se poderem deslocar ao nosso país. Noutros telejornais deu-se também como exemplo, bem personificado, a ocupação do Jornal da Madeira, para garantir o pluralismo de opinião, por candidatos do Partido Nova Democracia. E a ocupação do Ministério da Educação por meia dúzia de professores não colocados, que suponho eu tinham a aprovação e cobertura do sindicato.

Está-se pois a criar um clima intimidatório que visa unicamente afastar gente das manifestações, garantindo que elas podem vir a ser perigosas. Tudo isto, acompanhado de reportagens, como uma que ontem foi mostrada na RTP, onde se interrogava na praia porque é que as pessoas tinham preferido estar ali a ir à manifestação. Pergunta completamente a despropósito, já que aquilo que se pretendia mostrar era o bom tempo que fazia e a e grande afluência em as praias ainda tinham. Hoje igualmente foi-se ouvir a opinião de um sociólogo sobre o assunto, José Adelino Maltez, que, com ar muito douto, dizia que não havia perigo de agitação social porque a pessoas não se interessariam por tal coisa, preferindo não ligar a estes temas. Como voltámos alegremente, pela mão deste politólogo de serviço, ao velho lema salazarista “a minha política é a do trabalho”.

Mas o mais grave disto tudo é a informação de que o SIS está igualmente a estudar este assunto e a infiltrar agentes nas estruturas ditas subversivas, para prevenir futura agitação. Penso pois para mim que, tal como tempo da PIDE, aí teremos uma senhor agente a tentar chegar à cúpula da Intersindical para saber o que ela decide em matéria de manifestações ou de lutas sociais, ou a tentar chegar à Comissão Política do PCP ou do Bloco para conhecer e informar qual é o futuro programa de agitação destes partidos.

Foi por isso que a reacção, incluindo o PS, nunca quis que estes partidos participassem na Comissão de Acompanhamento das suas actividades. Espero que um devido protesto seja lavrado por eles na Assembleia da República pela insinuação rascosa que foi feita.

Os tempos vão ser duros e temos que nos preparar para uma luta feroz contra a direita no poder que a única coisa que conhece e sempre utilizou foi a chanfalhada ou a bufaria para reprimir os trabalhadores.

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